domingo, 28 de agosto de 2016

Acesso de Cuba à Internet completa 20 anos.

Apesar das dificuldades impostas pelo bloqueio, pouco a pouco a internet passa a ser cada vez mais acessada na Ilha. Ainda assim, ao contrário do que pode parecer, o acesso dos cubanos tanto às redes externas quanto internas não é novidade.

Nesse 22 de agosto, completa-se 20 anos desde que o pleno acesso de Cuba à Internet ocorreu, através da ligação do IDICT com o GLOBAL-ONE fornecedor dos EUA, por meio de um canal de transmissão 64 Kbs, o que favoreceu significativamente o serviço de e-mails.

Em 1973, Cuba juntou-se ao Centro Internacional de Informação Científica e Técnica dos países membros do Conselho de Assistência Mútua Econômica (CAME), e começou seu trabalho no Sistema Internacional de Informação Científica e Técnica. Neste mesmo ano entra em funcionamento a estação terrestre Caribe, integrada ao sistema Intersputnik  de comunicações por satélites artificiais.

Entre fevereiro de 1983 e maio de 1984, um grupo de especialistas e instituições cubanas e soviéticas começou a realizar um trabalho experimental conjunto para a transmissão automatizada de informações via satélite. Em 1985, instalou-se o Centro Nacional de Intercâmbio Automatizado de Informações, um microcomputador de fabricação Norueguesa para desenvolver gradualmente e testar vários serviços telemáticos, incluindo mensagens eletrônicas. [1]

Em Junho de 1987, estabeleceu-se na província de Matanzas o primeiro equipamento de comunicações desenvolvido em Cuba com a sua própria tecnologia, e permitiu-se o estabelecimento de uma pequena rede experimental ao serviço do Poder Popular Provincial, que funcionou como parte da rede da Academia de Ciências de Cuba (REDACC).

O relatado até aqui mostra os esforços feitos pelo governo cubano desde os anos 1970, para acelerar a introdução de tecnologias que permitissem o desenvolvimento de redes de computadores no país e acesso à informação

Creio que é importante lembrar que, desde 1986, a empresa de telecomunicações dos Estados Unidos, a AT & T, começou a negociar com o governo de seu país a autorização para construir um cabo submarino analógico entre os EUA e Cuba, que substituiria ultrapassado sistema troposférico, única via de comunicação existente entre os dois países na época.

Em meados de 1988 são obtidas as autorizações para a colocação do cabo submarino sem deixar de aplicar o bloqueio tecnológico contra Cuba, porque era um trecho de cabo de tecnologia ultrapassada, recuperado do fundo do mar depois de ser substituído no Atlântico, e com uma capacidade de apenas 143 circuitos, quando as necessidades de tráfego existente eram muito mais elevadas. Não obstante essa discriminação tecnológica, o governo cubano também autorizou a realização da ligação como um esforço a mais para manter as comunicações.

Em 1989, depois de vários meses destinadas a prospecção, projeção, preparação, colocação de cabos e sintonia das estações, conclui-se a instalação do sistema de cabo submarino analógico  entre Cuba e os EUA, o denominado Cabo No 7 .

Apesar disso, este cabo nunca foi posto em serviço já que o governo dos EUA não aprovou um acordo de serviços justo, razoável, equitativo, e em conformidade com as normas internacionais entre os operadores de telecomunicações de ambos os países. Da mesma forma, durante anos impediram com que Cuba fosse conectada a redes de telecomunicações internacionais via cabos de fibra ótica que passam perto da ilha, alguns poucos 30 quilômetros, forçando conexões com uso de satélites, que não só são mais caros, mas que são de banda mais restritas, mantendo as conexões lentas.

Em 1996, Cuba tinha quatro redes com conexões internacionais: Centro de Engenharia Genética e Biotecnologia (CIGBnet), Centro de Intercâmbio Automatizado de Informação (CENIAI), Jovem Club (Tinored) e Ministério da Saúde (Infomed). Naquele ano, um relatório da Rand Corporation, um think tank ligado ao Departamento de Defesa dos Estados Unidos reconhece que "Cuba tem desenvolvido uma considerável comunidade de redes com capacidades e serviços. Isso é o resultado de uma dedicação de longo prazo para a educação em toda a sociedade, um importante desenvolvimento de programas de pesquisa e terapêuticos no campo da biotecnologia e da medicina. Cuba tem todo o conhecimento necessário para operar um link de IP internacional e o consentimento do governo. Faltam fundos e um contrato de trabalho ou plano de cooperação entre várias redes; mas, eventualmente, irão conseguí-lo "[2]

Entre as recomendações da Rand Corporation para o Pentágono refletidos nesse relatório estão: estimular uma conexão IP direta com a Internet para dar aos cubanos acesso interativo a materiais estrangeiros; dar uma resposta rápida ao pedido feito pela empresa WilTel de uma autorização para construir um cabo óptico entre os Estados Unidos e Cuba, pendente desde março de 1994, e outras solicitações para fornecer vários serviços relacionados a dados; estimular viagens desde Cuba para fins de treinamento e capacitação na administração de redes de computadores, e outras formas de intercâmbio técnico.

Neste contexto, ocorre o pleno acesso de Cuba à rede, há 20 anos. O progresso discreto na expansão dos serviços de Internet, na minha opinião, tem como raiz o bloqueio tecnológico, a interferência nos assuntos de nosso país usando as TIC e as dificuldades de natureza interna que prevaleceram nesse período.

Escrito por Omar Pérez Salomón, publicado em La Pupila Insomne
Tradução Equipe Fuzil contra Fuzil.

Notas:

[1] Do livro “Secretos de Internet”.

[2] Relatório da Rand Corporation: “Las telecomunicaciones cubanas, la red de computación y las implicaciones en la política de los Estados Unidos.” Elaborado para a Oficina do Secretário de Defesa dos Estados Unidos, julho de 1996.

domingo, 21 de agosto de 2016

Cuba é uma nação socialista - Fidel Castro - Parte II

Leia a Parte I.

Discurso Pronunciado por Fidel Castro em  1º de Maio de 1961

"...

Não há Tempo para Eleições

Houve um período para a abolição de privilégios. As pessoas agora tem tempo para eleições? Não! O que eram os partidos políticos? Só uma expressão dos interesses de classe. Aqui só há uma classe, a humilde; aquela classe está no poder, então ela não está interessada na ambição de um minoria exploradora de voltar ao poder. Aquelas pessoas não teriam nenhuma chance em uma eleição. A revolução não tem tempo a perder com esse tipo de tolices. Não há chance para a classe exploradora reconquistar o poder. A revolução e povo sabem que a revolução expressou sua vontade; a revolução não vem ao poder com armamento ianque. 

Ela vem através da vontade do povo em luta contra todo tipo de armamento, armamento ianque.

A revolução mantêm-se no poder através do povo. No que o povo está interessado? Em fazer a revolução avançar sem perder um só minuto. (Aplausos) Pode qualquer governo na América afirmar ter mais apoio popular que esse? Por que a democracia deve ser essa pedante e falsa democracia dos outros, ao invés dessa direta expressão da vontade do povo? As pessoas morrem lutando ao invés de ir a uma eleição para escrever nomes em um papel. A revolução deu a cada cidadão uma arma, uma arma a todo homem que quis entrar na milícia. Então algum tolo vem para perguntar se, tendo a maioria por que nós não fazemos eleições? Porque o povo não se importa de satisfazer tolos e pequenos finos cavalheiros! As pessoas estão interessadas em avançar.
Eles não tem tempo a perder. O povo deve gastar uma quantidade tremenda de energia se preparando contra agressões, enquanto todos sabemos que queremos construir escolas, casas e fábricas. Não não somos belicosos. Os ianques gastam a metade de seu orçamento em armamento; não somos belicosos. Nós somos obrigados a despender aquelas energia, por causa dos imperialistas. Não temos ambições expansionistas. Não queremos explorar nenhum trabalhador de nenhum país. Não estamos interessados em planos agressivos; fomos forçados a ter tanques, aviões, metralhadoras e força militar para nos defender.
A recente invasão mostra o quão corretos estamos em nos armar. Em Playa Giron eles vieram para matar camponeses e trabalhadores. O imperialismo forçou-nos ao armamento para nossa defesa. Fomos forçados a colocar energia, materiais e recursos nisso, embora preferiríamos colocar esses recursos em mais escolas, para que em futuros desfiles possa existir mais atletas e estudantes. Se nosso povo estivesse desarmado, eles não poderiam ter esmagado os mercenários que vieram com equipamentos modernos.
Os imperialistas teriam se lançado contra nós a muito tempo se não nos tivéssemos armado. Mas nós preferimos morrer antes de render o país que temos agora. Eles sabem disso. Eles sabem que encontrarão resistência e então os círculos agressivos do imperialismo devem parar e pensar.
Então somos forçados, pela ameaça de agressão a proclamar aos quatro cantos do mundo: Todo o povo da América deveria se elevar em indignação depois da afirmação de que um país pode intervir em outro só por causa o primeiro é mais forte. Tal política significaria que o vizinho mais poderoso tem o direito de intervir para evitar um povo de se autogovernar de acordo com sua escolha. É inconcebível que deveriam existir miseráveis governos como esses; depois da agressão que matou trabalhadores e camponeses, é inconcebível que eles até mesmo tenham começado uma política de romper com Cuba, ao invés de romper com Somoza, Guatemala, ou o governo de Washington que paga por aviões, tanques e armamentos para vir aqui e matar camponeses.
O governo da Costa Rica disse que, se os mercenários fossem executados, romperia relações conosco. Eles não tem razão alguma para romper, então buscam um pretexto, nesse caso escolhendo  a questão das execuções.
Aqueles que promovem a política de usar Cuba, às ordens do imperialismo, são traidores miseráveis aos interesses e sentimentos da América. (Aplausos) Esses fatos mostram-nos a política podre que prevalece em muitos países latino americanos, e como a revolução cubana inverteu essas formas corruptas para estabelecer novas formas nesse país.
Nova Constituição Socialista
Para aqueles que falam a nós sobre a Constituição de 1940, nós respondemos que a Constituição de 1940 está datada e velha para nós. Nós avançamos muito rápido para aquela pequena seção da Constituição de 1940, que era boa para o seu tempo, mas nunca foi posta em prática. Aquela constituição foi ultrapassada pela revolução, que como dissemos, é uma revolução socialista. Devemos sim falar de uma nova constituição, uma nova constituição, mas não uma constituição burguesa, não uma constituição que corresponda a dominação e exploração de certas classes, mas uma constituição que corresponda a um novo sistema social sem a exploração do homem sobre o homem. O novo sistema social é chamado de socialismo e essa constituição será, consequentemente, uma constituição socialista.

Protesto de Kennedy
Se o Sr. Kennedy não gosta de socialismo, nós não gostamos de imperialismo! Nós não gostamos de capitalismo! Nós temos todo direito de protestar sobre a existência de um regime capitalista-imperialista a 90 milhas de nossa costa. No passado e agora, nós não pensamos em protestar em relação a isso, porque isso é coisa do povo dos Estados Unidos. Seria absurdo para nós tentarmos contar para o povo dos Estados Unidos que sistema de governo eles deveriam ter, nesse caso nós estaríamos considerando que os Estados Unidos não são uma nação soberana e que nós temos direitos sobre a vida política interna dos Estados Unidos.
Direitos não vem com tamanho. Direitos não vem do fato de um país ser maior que o outro. Isso não importa. Nós temos um território limitado, uma pequena nação, mas nosso direito é tão respeitável quanto o de qualquer país, independentemente do tamanho. Não nos passa pela cabeça falar para o povo dos Estados Unidos qual sistema de governo eles devem ter. Portanto, é absurdo o Sr. Kennedy nos falar qual governo ele quer que estabeleçamos aqui. Isso é absurdo. Sr. Kennedy faz isso por não ter um conceito claro de leis internacionais nem de soberania. Quem teve essas ideias antes de Kennedy? Hitler e Mussolini!
Eles falaram a mesma língua, a da força; é a língua fascista. Nós ouvimos anos antes do ataque da Alemanha sobre a Czechoslovakia. Hitler a dividiu pois era governada por um governo reacionário. A burguesia, reacionária e protofascista, com medo do avanço do sistema socialista, preferiu até a dominação de Hitler. Nós ouvimos aquela linguagem na véspera da invasão a Dinamarca, Bélgica, Polônia e assim por diante. É o direito do poder. Esse é o único direito que Kennedy sugere quando declara o direito a interferência em nosso país.
Esse é um sistema socialista, sim! Sim, esse é um regime socialista. Está aqui, mas a culpa não é nossa, a culpa e é de Colombo, dos colonizadores ingleses, os colonizadores espanhóis. O povo dos Estados Unido algum dia ficará cansado.

Nenhuma ameaça aos Estados Unidos

O governo dos Estados Unidos diz que um regime socialista aqui ameaça a segurança dos Estados Unidos. Mas o que ameaça a segurança do povo da América do norte é a política agressiva dos belicistas dos Estados Unidos. O que ameaça a segurança da família da América do norte e seu povo é a violência, a política agressiva, aquela política que ignora a soberania e os direitos dos outros povos. Aquela política agressiva pode levar a uma guerra mundial; e a guerra mundial pode custar as vidas de dezenas de milhões de norte americanos. Portanto, aquele que ameaça a segurança dos Estados Unidos não é o Governo Revolucionário de Cuba, mas o agressor e agressivo governo dos Estados Unidos.
Nós não colocamos em perigo a segurança de um único norte-americano. Nós não pomos em perigo a vida ou a segurança de uma única família norte-americana. Nós, fazendo cooperativas, reforma agrária, ranchos do povo, casas, escolas, campanhas de alfabetização e mandando centenas e centenas de professores para o interior, construindo hospitais, mandando médicos, dando bolsas de estudos, construindo fábricas, aumentando a capacidade produtiva do país, criando praias públicas, convertendo fortalezas em escolas e dando ao povo o direito a um futuro melhor – nós não pomos em perigo uma única família ou um único cidadão dos Estados Unidos da América.
Aqueles que colocam em perigo milhões de famílias, de dezenas de milhões de norte-americanos são aqueles que brincam com a guerra atômica. São aqueles que, segundo General Cardenas fala, estão brincando com a possibilidade de Nova York se tornar Hiroshima. Aqueles que estão brincando com a guerra atômica, com a sua guerra agressiva, com a sua política que viola os direitos do povo são aqueles que colocam em perigo a segurança da nação da América do norte, a segurança das vidas de  milhares de norte-americanos desconhecidos.

O que os monopolistas temem? Eles dizem que não estão seguros com uma revolução socialista por perto. Eles estão, como Khruscev fala, provando que seu sistema é inferior. Eles nem acreditam no próprio sistema. Por que eles não nos deixam em paz quando o que o nosso governo quer é paz?

A recusa do EUA em negociar


Recentemente, nosso governo publicou a afirmação de que nós estaríamos dispostos a negociar. Por que? Porque nós temos medo? Não! Nós estamos convencidos que eles temem a revolução mais do que tememos eles. Eles tem uma mentalidade que não os permite dormir quando eles sabem que existe uma revolução por perto.
Medo? Ninguém tem medo aqui. O povo que luta pela sua liberdade nunca se amedronta. Os amedrontados são os ricos. Aqueles que tem sido ricos. Nós não temos interesse no suicídio do imperialismo às nossas custas. Eles não se importam com a morte de negros, porto riquenhos ou americanos. Mas nós nos importamos com cada vida cubana. Nós estamos interessados em paz.
Nós estamos prontos para negociar. Eles falam que as condições econômicas podem ser discutidas, mas não o comunismo. Bem, de onde eles tiraram a ideia de que nós discutiríamos isso? Nós discutiríamos problemas econômicos. Mas não estamos prontos para admitir essas conversas tanto quanto a pincelada de uma pétala de uma rosa. O povo cubano é capaz de estabelecer o regime que ele quiser. Nós nunca pensamos na possibilidade de discussão do regime. Nós discutiremos apenas coisas que não afetem nossa soberania. Nós queremos negociar em nome da paz.
Aqueles que não se preocupam sobre encaminhar o povo americano para guerra estão sendo guiados por emoções. Nós não temos medo. Se eles pensam que sim, deixem eles rejeitarem aquela ideia. Nenhum cubano está com medo. Se eles pensam que discutiremos nossa política interna, deixem eles esquecerem isso. Deixem eles discutir todos os tópicos que querem discutir. Nós discutimos com os invasores, não? Bem, nós debateremos com qualquer um. Nós estamos dispostos a falar. Estamos dispostos a debater. Mas isso quer dizer que desejamos negociar nossa política interna? Claro que não. Nós estamos apenas dando um passo sensato. Isso quer dizer que a revolução irá desacelerar? Claro que não! Nós continuaremos, pegando velocidade o quanto pudermos.

Matar invasores estrangeiros

Se eles querem dizer que não se importam com a soberania dos países, deixem-nos dizê-lo. Mas estamos prontos para defender, bem como negociar. Nós estamos prontos para atirar um milhão de tiros no primeiro ianque paraquedista que tentar pousar aqui. Do primeiro momento que eles desembarcarem em nosso solo eles podem ter certeza que eles começaram a guerra mais difícil das quais eles já ouviram. Aquela guerra seria o começo do fim do imperialismo. Com a mesma disponibilidade para negociar, nós lutaremos. Até mesmo os pioneiros lutariam. Cada homem, mulher e criança tem um dever no caso de um ataque estrangeiro – matar! Se nós somos atacados por estrangeiros não haverá prisioneiros. O invasor estrangeiro deve saber que deve matar a todos nós! Enquanto um viva, ele terá um inimigo! Luta de vida ou morte! Não há meio termo! Será uma guerra sem prisioneiros!
Se os invasores desembarcam em solo cubano não iremos querer nossas vidas. Nós lutaremos até o último homem contra qualquer um que colocar os pés em nossa terra. Todos os homens e mulheres devem saber de seus deveres. Esse dever será cumprido de maneira simples e natural enquanto o povo luta uma guerra justa.
É um crime que nosso povo não seja deixado em paz para completar nosso trabalho de justiça por aqueles que outrora viveram em humilhação e miséria. É uma pena que interesses ilegítimos foram determinados a causar o mal a nosso país. Enquanto eles tentaram  cortar nossos suprimentos, eles estavam abastecendo os mercenários com armas para invadir nosso país e derramar o sangue do povo. E nessa vergonhosa tarefa, quem participou?
Eu já os falei sobre sua composição social. Padres também não faltavam. Três deles vieram. Nenhum era cubano, eles eram espanhóis. Você lembra que quando nós perguntamos eles disseram que vieram em uma missão puramente espiritual. Eles disseram que vieram em uma missão cristã. Mas revisando os seus livros nós achamos isso: um apelo para o povo por Ismael de Lugo: "Atenção católicos cubanos: as forças libertadoras desembarcaram em praias cubanas. Nós viemos em nome de Deus – como se Calvino viesse no nome de Deus – justiça e democracia para reestabelecer a pisoteada liberdade - Isso deve ser mentira. Nós viemos por causa do amor, não do ódio. Nós viemos com milhares de cubanos, os quais são católicos e cristãos – que mentira, cujo espírito é o espírito dos cruzados. (Notas do Editor: Castro continua lendo a mensagem escrita pelo Padre de Lugo...)

E esse cavalheiro não é nem cubano; ele é um espanhol falangista. Ele poderia ter economizado todos aqueles apelos e energia de guerreiro para lutar contra a guarda moura de Franco. Por que ele veio aqui com outros 3 padres falangistas espanhóis ao invés de ir para a Espanha lutar pela liberdade contra Franco, que está oprimindo o povo espanhol por 20 estranhos anos e que se vendeu  para o imperialismo ianque? Os ianques não estão lutando pela liberdade na Espanha, Nicarágua ou Guatemala. Eles são grandes amigos de Franco. E esses padres falangistas vieram aqui, quando é na Espanha que eles deveriam estar lutando pela liberdade, pelos camponeses e trabalhadores. Os padres falangistas ao invés disso vem aqui pregar contra os trabalhadores e camponeses que se livraram da exploração. E vieram três, não apenas um; e o quarto, em Escambray, é espanhol também.

Padres estrangeiros a serem expulsos

Nós vamos anunciar aqui para o povo que nos próximos dias o Governo Revolucionário passará uma lei declarando inválida qualquer permissão assegurada por qualquer padre estrangeiro nesse país. E essa lei terá uma única exceção: vocês sabem a quem? Um padre estrangeiro poderá ficar com permissão especial, aprovada pelo governo, se ele não estiver combatendo a revolução e não estiver mantendo atividades contrarrevolucionárias. Ele pode pedir permissão, e o governo poderá garantir se considerar adequado, pois existem padres estrangeiros, pela via da exceção, que não se posicionaram contra a revolução, embora a regra geral seja o contrário.
Claro, eles falarão que somos ímpios, inimigos da religião. Como eles podem dizer isso depois de um líder de um serviço eclesiástico, enquanto proclamava que ele estava chegando para realizar um serviço espiritual, também assinou um manifesto como esse – de natureza política? Pode a revolução continuar permitindo atos como esses continuarem impunes?
E deixar esses cavalheiros trazerem o inferno aqui, trazerem o inferno para a terra aqui, com a guerra criminosa, seus calvinistas, seus Soler Puigs, seus latifundiários e seus filhos privilegiados, para trazer o inferno para a terra aqui para os camponeses e trabalhadores? Podemos deixar a falange espanhola continuar promovendo derramamento de sangue e conspiração aqui por meio de seus padres? Não, nós não estamos dispostos a permitir isso. Os padres falangistas sabem agora, eles podem começar a fazer as malas (Aplausos).
Eles estão realizando atividades contrarrevolucionárias nas escolas também, envenenando as mentes  dos alunos. Eles estão formando mentes terroristas. Eles estão ensinando ódio para o país. Por que a revolução deveria tolerar isso? Seríamos culpados se deixássemos isso ir adiante.

Nacionalização das escolas privadas
Nós anunciamos aqui que nos próximos dias o governo revolucionário irá passar uma lei nacionalizando as escolas privadas. Essa lei não pode ser uma lei para um setor; será geral. Isso quer dizer que escolas privadas serão nacionalizadas; claro, não uma pequena escola, na qual uma professora dá aulas, mas escolas privadas com vários professores.
Diretores de escolas privadas mostraram diferentes tipos de conduta. Muitas diretores de escolas privadas não estão inculcando veneno contrarrevolucionário. A revolução sente como sendo seu dever organizar e estabelecer o princípio de educação gratuita para todos os cidadãos. O povo sente que ele tem o dever de treinar as futuras gerações no espírito de amor por seu país, por justiça, pela revolução.
O que deve ser feito no caso de escolas privadas que não mostraram conduta contrarrevolucionária? O governo Revolucionário indenizará aqueles diretores ou donos de escolas cuja atitude não tiver sido contrarrevolucionária, cuja atitude foi favorável para a revolução; e a revolução não indenizará nenhuma escola cujos professores estão travando uma campanha contrarrevolucionária, que foram contra a revolução.
Aos professores e empregados de todas essas escolas, serão dados trabalhos. Ou seja, os empregados e professores dessas escolas terão trabalhos garantidos. Os alunos dessas escolas poderão continuar frequentando-as, os padrões educacionais será mantido alto ou aumentado e além disso, eles  não terão de pagar absolutamente nada para frequentá-las.

Religião não é restringida

Villanueva é incluída nessa nacionalização, claro. Eles falarão que esse governo ímpio se opõe à instrução religiosa. Não senhor. Nós nos opomos é contra esses atos sem-vergonha que estão sendo cometidos e esse crime contra o nosso país. Eles podem ensinar religião, sim; nas igrejas eles podem ensinar religião.
Religião é uma coisa, política é outra. Se esses cavalheiros não fossem contra os interesses políticos do povo, não poderíamos nos importar menos com suas pastorais, a discussão de questões religiosas, etc. As igrejas podem manter-se abertas; religião pode ser ensinada aqui, Não seria muito melhor se eles se restringissem aos seus ensinamentos religiosos? Não seria melhor ter paz? Eles podem ter paz, dentro de estritos limites de respeito de acordo com o povo revolucionário e o governo. Mas eles não podem guerrear contra o povo em serviço dos exploradores. Isso não tem nada a ver com religião; tem a ver com sangue, com ouro, com interesses materiais. Eles podem ter consideração pelo povo, nos limites de respeito e direitos mútuos.
O cristianismo surgiu como uma religião dos pobres, de escravos e dos oprimidos de Roma – a religião que floresceu nas catacumbas. Era a religião dos pobres e obteu o respeito de leis. Coexistiu com o Império Romano. Então veio o feudalismo. Aquela igreja coexistiu com o feudalismo, mais tarde com monarquias absolutas, depois com repúblicas burguesas. Aqui a república burguesa desaparece; por que não deveria a mesma igreja coexistir com um sistema de justiça social que é muito superior às formas anteriores de governo? Esse sistema é muito mais cristão que o imperialismo ianque ou política burguesa, ou o Império Romano. Nós acreditamos que a coexistência é perfeitamente possível. A revolução não se opõe à religião. Eles usaram a religião como um pretexto para combater os pobres. Eles esquecem o que Cristo disse sobre ser mais fácil para um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um homem rico ir para o céu.

O pequeno homem de negócios protegido
Aqueles são fatos. Nós falamos, com sempre, claramente. Isso apenas quer dizer que estamos preparados para defender a revolução e continuar avançando, convencidos da justiça de nossa causa.
Nós falamos de nossa revolução socialista. Não quer dizer que o pequeno homem de negócio ou pequeno industrial precise se preocupar. Minas, combustível, bancário, usinas de açúcar, comércio de exportação e importação – a maior parte da economia – está nas mãos do povo. Dessa forma o povo pode desenvolver nossa economia. O pequeno industrial e pequeno homem de negócios podem coexistir com a revolução. A revolução sempre teve cuidado em relação aos interesses dos pequenos proprietários.
A reforma urbana é uma prova. Esse mês, todos os pequenos proprietários de terras receberão cerca de 105,000 pesos. Antigamente, se o inquilino não pagasse o aluguel, o proprietário não recebia; agora um fundo foi estabelecido para garantir que o dono da terra seja pago. A revolução terá 80 milhões de pesos por ano para construção pela reforma urbana. E quando o aluguel é a única renda desses donos de terra, a revolução determinou que depois que a casa foi integralmente paga, o dono de terra receberá uma pensão. Uma revolução socialista não quer dizer que os interesses de certos setores serão eliminados sem consideração. Os interesses dos grandes proprietários de terras, banqueiros e industriais foram eliminados. Nenhum interesse social dos níveis mais baixos da sociedade foram condenados. A revolução irá aderir à sua palavra: nenhum interesse médio será afetado sem consideração.
Pequenos empresários e industriais tem crédito hoje. A revolução não tem interesse na sua nacionalização. A revolução tem o bastante para desenvolver as fontes de riqueza que agora tem a sua disposição. A revolução sente que aqui pode existir colaboração do pequeno empresário e do pequeno industrial. Ela acredita que seus interesses  podem coincidir com aqueles da revolução. 

Contrarrevolucionários afirmaram que as barbearias seriam nacionalizadas, mesmo barracas de comida. A revolução não os tem como objetivo. A solução desses problemas será o resultado de uma longa evolução. Existe alguns problemas; algumas vezes tomates e abacaxis são vendidos na cidade a preços mais altos do que nos campo. Ainda existe uma pequena praga de atravessadores. A revolução ainda tem de tomar medidas para se livrar dos abusos dos atravessadores, para melhorar o consumo para as pessoas. Mas eu não quero que as pessoas fiquem confusas. Eu quero que todos saibam o que esperar.

O chamado para a colaboração
Basicamente a revolução já passou suas medidas. Ninguém precisa se preocupar. Por que não se juntar a esse entusiasmo, nessa proeza? Por que ainda existem cubanos aborrecidos por essa felicidade? Eu me perguntei isso enquanto assistia o desfile. Por que alguns cubanos são incapazes de entender que sua felicidade pode também ser deles? Por que eles não se adaptam à revolução? Por que não ver as suas crianças nas escolas aqui? Algumas pessoas não podem se adaptar, mas a sociedade futura será melhor do que a antiga.
Essa é a hora na qual nós, longe de usarmos o momento contra os que não entendem, devemos perguntar a eles se já não é tempo deles se juntarem a nós. 

A revolução considera necessário que eles sejam retidos. Talvez eles já tenham sido. A revolução não quer que se use força contra a minoria. A revolução quer que todos os cubanos entendam. Nós não queremos que toda essa felicidade e emoção toda apenas para nós. É a glória do povo.
Nós dissemos a todos que mentiram no passado e não entenderam. Nós francamente dizemos que nossa revolução deveria ser menosprezada pelas sanções severas contra os mercenários. Isso serve como uma arma para os nossos inimigos. Nós dizemos isso, porque nós contamos ao povo tudo o que beneficiará a revolução. Nós tivemos uma vitória moral e será maior se nós não mancharmos a nosso vitória.
As vidas perdidas nos machucam o mesmo que machucam aos outros, Mas nós devemos superar isso e falar pelo prestígio e pela nossa causa. O que está diante de nós? O risco da agressão imperialista! Grandes tarefas! Chegamos ao ponto no qual nós devemos entender que chegou o momento de fazermos o nosso maior esforço. Os próximos meses são muito importantes. Eles serão meses nos quais nós devemos fazer grandes esforços em todos os campos. Todos nós temos a tarefa de fazer o máximo, ninguém tem o direito de descansar. Com o que nós vimos hoje, nós devemos aprender que com esforço e coragem nós podemos colher magníficos frutos. E as frutas de hoje não são nada se comparadas ao que pode ser feito se nós nos empenharmos ao máximo.
Antes de concluir, eu gostaria de lembrar o que eu disse no julgamento Moncada. Aqui está o parágrafo: O país não pode ficar de joelhos implorando milagres do bezerro de ouro. Nenhum problema social é resolvido espontaneamente. Nesse momento tínhamos expressado nossos pontos de vista. 

A revolução seguiu as ideias revolucionárias daqueles que tiveram um importante papel nessa luta.
Esse é o porquê de quando um milhão de cubanos se reuniram para proclamar a Declaração de Havana, o documento expressou a essência da revolução, nossa revolução socialista. Dizia que condenava os proprietários de terra, os salários de fome, analfabetismo, falta de professores, médicos, hospitais, discriminação, exploração das mulheres, oligarquias que atrasavam o país, governos que ignoravam a vontade do povo obedecendo as ordens dos EUA, monopólios das agências de notícias ianques, leis que preveniam as massas de se organizarem e os monopólios imperialistas de riqueza. A assembleia geral do povo condenou a exploração do homem pelo homem. A assembleia geral proclamou o seguinte: o direito ao trabalho, educação, dignidade do homem, direitos civis às mulheres, previdência aos aposentados, liberdade artística, nacionalização dos monopólios. Esse é o programa de nosso revolução socialista.

Vida longa à classe trabalhadora cubana! Vida longa às nações latino-americanas! Vida longa à nação! Pátria ou morte! Venceremos!"

Tradução: equipe do Fuzil contra Fuzil

sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Os 90 anos de Fidel Castro, o revolucionário real.


Em 13 agosto de 2016, Fidel Castro, o Comandante en Jefe da Revolução Cubana, completa 90 anos de vida

Fundamentalmente, aos que são jovens em nossos tempos e que conhecem um pouco da história, em um momento em que as agressões que sofrem os povos se multiplicam, quando a realidade nos impõe uma das maiores tarefas da história da humanidade, dar-se conta de que em nosso planeta, enquanto pensamos, escrevemos e lutamos, respira, vive e pensa, ao completar 90 anos, Fidel Castro Ruz é, sem dúvida, inspirador.
Fidel Castro, 15 de fevereiro de 1965.

Não porque se Fidel não estivesse fisicamente presente, como passaram e passarão a estar os grandes homens e mulheres da humanidade, seria menor sua capacidade de inspirar àqueles que almejam a honra de serem revolucionários.

Mas, porque, de forma bastante simples, o fato de Fidel permanecer por mais de 70 anos combatendo, das diversas formas, carregando fuzis, liderando seu povo, enfrentando o imperialismo, e o fato de hoje estar vivo, são capazes de nos fazer lembrar que os grandes líderes revolucionários são também homens de carne e osso, o que os torna muito mais impressionantes, muito mais reais e, paradoxalmente, seus feitos muito mais fantásticos. Saber que são homens de carne e osso nos impõe grandes responsabilidades.

É justamente essa realidade, essa materialidade de sua dedicação, que converte Fidel, como aos grandes homens e mulheres dos séculos, em exemplo a se seguir. Nem santos e nem filhos de deuses têm o poder que um homem de carne e osso tem para inspirar e impelir à luta.

Os líderes revolucionários reais não só impelem os bons ao combate, mas também assustam e atordoam aos opressores. Sua própria existência é uma constante advertência, um alerta: “Somos sim os homens e mulheres mais avançados que servem à causa dos povos, mas não somos filhos de milagres, frutos da predestinação do milênio ou do acaso, somos o simples resultado do desenvolvimento histórico da sociedade, das contradições que a luta de classes engendra. E, como nós, mais cedo ou mais tarde, muitos outros notarão as tarefas que tem de ser realizadas e arregaçarão suas mangas. Não estamos sozinhos, porque essa marcha é inevitável.”

E, dessa marcha inevitável faz parte Fidel Castro, homem de carne e osso, que tem sua própria história.

Nasceu no ano de 1926, em Birán, pequena cidade do oriente de Cuba. Filho de Ángel Castro Ruz, espanhol que era dono de terras e relativamente rico, Fidel foi alfabetizado muito cedo, pois tinha que acompanhar seu irmão mais velho à escola, ainda que não tivesse idade para frequentá-la. Logo, aos seis anos de idade, foi enviado à cidade de Santiago de Cuba para que estudasse em colégios de jesuítas.

Sua infância localiza-se em período de extremo conflito político na História de Cuba. O então sargento Fulgêncio Batista – o mesmo que seria derrubado pelo movimento liderado por Fidel 20 anos depois – já iniciava sua carreira como executor de golpes miltares, e, com apoio da embaixada dos Estados Unidos, em 1934, dissolvia, mediante os fuzis do exército, um governo fruto de lutas populares e composto por elementos nacionalistas, o Governo dos Cem dias.

Adiante, como homem forte dos Estados Unidos, Batista alternaria na cabeça do Estado representantes sob seu controle. Seria eleito presidente de Cuba em 1940, após ter, em um momento, realizado amplas perseguições e, em outro, acenado às anistias como tentativa de legitimar-se.

Em meio a tudo isso, a adolescência de Fidel seria como a de muitos outros de sua classe de origem, um tanto quanto desligada dos acontecimentos políticos, com maiores preocupações como a prática dos esportes e suas férias no campo.

Somente mais tarde suas inquietudes se fundiriam definitivamente a sua personalidade, como resultado de todo um processo de aprendizado. Processo no qual foi imprescindível sua disposição de abrir mão das ambições individualistas, típicas dos homens de sua classe e de seu entorno.

Em 1945, aos 19 anos, ingressou na Universidade, em Havana, como mais um entre tantos jovens, esportista, espirituoso, e sem qualquer experiência ou conhecimento político, exceto alguma intuição e certo sentido de justiça derivado daquele contato mais imediato com os trabalhadores no campo e a repressão aberta que a gente humilde sofria do exército.

Ao ingressar na universidade, Fidel era mais um.

“Tinha me matriculado na Escola de Direito, todos os dias eu tinha que sair para a Universidade, pegar ônibus, por vezes dois – pelo menos um sempre muito super-lotado , havia que pegá-los e descer de pressa, porque os ônibus jamais paravam, depois caminhava uns quantos quarteirões…”, como relata. (1)

Mas esse mais um, conscientemente, pouco a pouco, foi ingressando nas atividades estudantis, num local que guardava em sua História forte tradição de vínculo aos interesses das massas populares. Da Universidade haviam saído muitos daqueles que formaram o governo progressista derrubado por Batista, muitos dos que haviam lutado contra as oligarquias e ditaduras, além dos que combateram as intervenções norteamericanas e o colonialismo espanhol.

No entanto, a memória de tal tradição de lutas, às quais o jovem Fidel era simpático, encontrava realmente poucos herdeiros sinceros. A tradição estava esmorecida pelo tempo, pela politicagem e acomodação de certos partidos e políticos, que também se proliferavam no movimento estudantil. Além do mais, “era uma universidade burguesa e de pequenos burgueses, com muitos poucos jovens procedentes de classes trabalhadoras”. (2) Uma Universidade para as elites, como muitas na América Latina.

Do jovem filho de fazendeiro ao revolucionário, certamente, não foi um caminho fácil.

A primeira atividade pela qual Fidel teve contato com círculos amplos de estudantes não foi propriamente o trabalho de caráter político. Fazia algo muito mais simples: começou como um representante de turma que se dedicava com afinco.

“Acho que comecei a distinguir-me entre os restantes dirigentes da Escola de Direito porque peguei a trabalhar a sério; jamais pensei que seria ajudado com uma nota ou que faria articulações para que um aluno recebesse uma qualificação não merecida. Não se tratava de que exercesse influência no professor, mas sim que ajudasse os estudantes em questões práticas relacionadas com os estudos. (…) Minhas primeiras atividades foram desse tipo, não era um programa de reformas universitárias nem um programa político. Realizava uma série de serviços úteis aos estudantes. Não lhes dizia: 'votem em mim'”. (3)

E a seriedade desde as tarefas mais simples, a marca que seria seu caráter distintivo durante toda trajetória, fez que, pouco a pouco, encontrasse o reconhecimento de seus pares e avançasse na atividade política, sendo eleito como representante na Federação Estudantil Universitária, a FEU.

A partir daí, passou a ter contato maior com a política, aperfeiçoando seus conhecimentos e combatendo as práticas do governo que havia se instalado: a tão perversa quanto usual associação oligárquica e a corrupção institucionalizada predominante nos países atrasados, como era Cuba. Diferenciando-se dos envolvidos nas rixas partidárias, que beiravam ao gangsterismo, foi na universidade que se fez revolucionário.

Mas não como e por um passe de mágica, como se houvesse algo como uma revelação de um dom político ou de uma habilidade inata.

O que é verdadeiro e, paradoxalmente, muito mais incrível do que a explicação que beira ao místico, justamente por seu aspecto real, é o argumento oferecido pelo próprio Comandante. O que o formou como revolucionário nesse período foi sua sinceridade com aquilo que acreditava que merecia sua atenção. Foi sua consequência que fez que pegasse “a trabalhar em sério”. Trabalhar em sério, com disciplina e espírito de sacrifício, foi o que o fez revolucionário.

Foi o que fez com que, passo a passo, frente aos desafios que se impunham, o jovem Fidel fosse colocando sua própria capacidade a prova, não sem inúmeros riscos, como fizeram todos os grandes revolucionários, despindo-se em cada ação daqueles resquícios do individualismo próprio do meio de onde provinha.

Isso se ilustra, por exemplo, no fato de que, quando jovem, a atividade de Fidel não se resumiu a estar na oposição ao governo de seu país, nem de manter a posição confortável de acusador a distância. Demonstrava seu internacionalismo, ainda que não tivesse descoberto o marxismo. Notava a opressão comum e estava resolutamente ao lado dos povos latino-americanos.

Justamente por essa solidariedade – que não era só de palavras – Fidel, por meio de um comitê em solidariedade à República Dominicana, embarcou em uma expedição militar que objetivava derrubar o governo do ditador Trujillo. Aos 19 anos ingressava em sua primeira ação armada, porque levava as coisas a sério.

Pouco tempo depois, na Colômbia, organizaria um Congresso de Estudantes de toda América Latina, de cunho anti-imperialista, que coincidiu com as revoltas populares do bogotazo, quando do assassinato do candidato liberal à presidência do país, Jorge Eliecér Gaitán. Nessas revoltas, Fidel tomou parte ativa ao lado povo, juntando-se aos insurretos e combatendo. Tinha somente 21 anos.

Nesse meio do caminho, teria contato com o socialismo científico:

"As ideias do marxismo-leninismo caíram em mim como água no deserto." (4)

Desses acontecimentos ao seu trabalho como advogado na defesa desinteressada daqueles que o solicitavam; a sua resistência ao segundo golpe de Batista; ao Assalto ao Quartel Moncada; ao Desembarque do Granma; à luta na Sierra; à tomada do poder; ao combate da invasão mercenária de Girón; à posição abnegada durante a Crise dos Mísseis; à consolidação do socialismo em Cuba; à mobilização do povo em todos os momentos; à resistência no dificílimo período da queda da URSS, nota-se que Fidel forjou a si próprio em grandes combates, com o espírito que lhe é característico e que tem sua força aglutinadora. Nota-se que há algo em seu exemplo que deve ser seguido, que é universal na conduta dos revolucionários: a capacidade de doar-se, oferecendo a própria vida à causa de seu povo, a todo momento, seriamente.

Espírito tão bem sintetizado por Guevara:

“E se nós estamos hoje aqui e a Revolução Cubana está hoje aqui, é, simplesmente, porque Fidel entrou primeiro no Moncada, porque desceu primeiro do Granma, porque esteve primeiro na Sierra, porque foi à Playa Girón em um tanque, porque quando havia uma inundação houve até briga porque não o deixaram entrar… porque tem como ninguém em Cuba, a qualidade de ter todas as autoridades morais possíveis para pedir qualquer sacrifício em nome da Revolução.(5)

Mas Fidel não é um mito, é um homem real. E, dessa forma – ainda que seja comparável aos mitos, porque muitos de seus feitos não encontram qualquer desvantagem frente ao que é atribuído às figuras mais incríveis e heróicas das epopéias –, por ser homem de carne e osso, é muito maior do que todas essas figuras somadas. É maior porque é o que há de mais humano, porque respira e atua como humano, porque, por ser humano, como diz Guevera, “tem a qualidade de ter todas autoridades morais possíveis para pedir qualquer sacrifício em nome da Revolução”, porque é a prova cabal de que os homens podem realizar obras colossais.

Fidel é o homem de carne e osso que arregaçou suas mangas colocando-se a trabalhar seriamente pela causa dos povos durante mais de 70 anos. Justamente por isso, por sua seriedade de combatente incansável e leal, não só provoca calafrios nas classes dominantes, como seu exemplo conclama, a todo instante, homens e mulheres dos diversos cantos do planeta a que sirvam integralmente à causa das classes exploradas.

Os povos do mundo não poderiam ter melhor inspiração.

Equipe do Fuzil contra Fuzil.

Notas:
(1)  “Fidel Castro Ruz, Guerrilheiro do Tempo – Conversações com o líder histórico da Revolução Cubana”(2012), Katiuska Blanco Castiñera, Rio de Janeiro, Editora Ebendinger, Livro I, p.270.
(2) – Ibidem, p. 303.
(3) – Ibidem, p. 303.
(4)  Ibidem, p. 448.
(5) – “El Che en Fidel Castro, Selección temática 1959-1997” (2007), Havana, Editoria Política, p. 205-206.